Notas
Compulsão alimentar é caracterizada por descontrole e culpa; entenda
FOLHAPRESS) – Repetir uma refeição saborosa, não resistir a um doce depois do almoço ou até ter dificuldade para parar de tomar refrigerantes nem sempre significam um comportamento alimentar compulsivo. Ingerir grandes quantidades de alimentos em pouco espaço de tempo e sem conseguir parar, porém, já é um sinal de alerta.
O TCA (Transtorno de Compulsão Alimentar) é caracterizado pela associação entre a falta de controle seguida da sensação de culpa após o episódio, aponta Glaucia Carneiro, professora adjunta da disciplina de endocrinologia e chefe do setor de obesidade da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
«Muitas vezes as pessoas têm compulsão alimentar e não sabem caracterizar muito bem e, por isso, não buscam ajuda», afirma. «Não é só o fato de comer porque está gostoso e então vou repetir.»
Alguns indicadores de um problema real são comer rapidamente grandes quantidades mesmo sem fome, ingerir alimentos até sentir desconforto e se sentir depressivo ou culpado após se alimentar.
A preocupação começa de fato, porém, quando impulsos de compulsão que antes eram esporádicos ocorrem de forma frequente e com maior duração. «Quando começar a acontecer ao menos uma vez por semana nos últimos três meses, já é hora de se preocupar e buscar tratamento», diz Carneiro.
O transtorno também não está associado a comportamentos compensatórios, como ocorre com a bulimia nervosa e anorexia, nas quais o paciente chega a induzir o vômito ou passar por grandes períodos sem comer.
A médica endocrinologista Maria Edna de Mel, presidente do departamento de obesidade da SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia) aponta que existem critérios definidos para o diagnóstico do TCA.
O Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, em inglês), conhecido como DSM-5, classifica a compulsão alimentar em até quatro estágios: leve, moderado, grave e extremo.
«Casos moderados, graves e extremos devem receber tratamento. Isso envolve uso de terapia cognitivo-comportamental e é fundamental que os profissionais – psicólogos, nutricionistas e médicos – tenham experiência com TCA para não gerar danos nos pacientes e agravar o quadro. Lembrando que não é só medicamento que pode gerar efeito colateral», afirma Melo.
Parar de comer compulsivamente também significa comer melhor. De acordo com Fábio Salzano, vice-coordenador do Programa de Transtornos Alimentares do IPQ (Instituto de Psiquiatria) do Hospital das Clínicas de São Paulo, é importante evitar uma dieta restritiva para reestabelecer o padrão nutricional adequado.
«A restrição pode gerar novamente a compulsão. É uma questão médica, não é falha de caráter ou falta de vontade de quem sofre com o problema», diz Salzano.
O TCA é um transtorno multifatorial, o que faz o tempo de tratamento variar entre pacientes. Pode ser desencadeado por aspectos biológicos como alterações de transmissores cerebrais, como por exemplo a dopamina e serotonina, ou por fatores genéticos. Também acontece por motivações psicológicas e socioculturais, como a busca de um ideal de beleza incompatível com o tipo físico, estigmas sobre peso ou problemas familiares.
Glaucia Carneiro pontua que a patologia pode também causar alterações metabólicas de glicemia, colesterol e pressão, além de aumentar o risco de doença cardiovascular. «Com certeza o indivíduo ingere mais calorias do que gasta nestes episódios de compulsão e isso gera ganho de peso», aponta.
Um estudo publicado na revista Nature em março deste ano feito por especialistas de psiquiatria e nutrição aponta que o TCA, apesar de mais diagnosticada em obesos, não acomete apenas quem atende a este critério.
A publicação, chamada de «Binge eating disorder» (Transtorno de compulsão alimentar, em português), estima que entre 2018 e 2020 o TCA atingiu de 0,6% a 1,8% das mulheres adultas e de 0,3% a 0,7% dos homens adultos.
O artigo reforça que o primeiro objetivo médico nestes casos deve ser o fim da compulsão alimentar nos pacientes. «O tratamento da perda de peso pode ser oferecido para aqueles que conseguem se abster da compulsão alimentar», afirmam os pesquisadores.
Outro trabalho publicado no International Journal of Obesity, também da Nature Group, aponta que o TCA prevalece entre indivíduos que procuram tratamento para perda de peso e que em quase metade dos obesos com o transtorno, o início da compulsão alimentar é anterior a obesidade.
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